INTRODUÇÃO
Antes de tudo, é importante destacar que o município de Curitiba é aderente ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), em contraponto ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Para uma melhor compreensão, o Regime Geral é o sistema previdenciário aplicado, basicamente, ao setor privado. Todo trabalhador com carteira assinada já é automaticamente inscrito como participante do RGPS. Outros trabalhadores autônomos precisam se inscrever. A todos eles são assegurados direitos de aposentadorias segundo as mesmas regras únicas, independente da qualificação do trabalhador. Para acessar o benefício, estes segurados são obrigados a realizar contribuições também segundo regras específicas. A Constituição Federal (CF), especialmente através do seu artigo 201, trata das regras gerais do RGPS¹.
Os servidores da União, Estados, Distrito Federal e Municípios podem ter um regime previdenciário exclusivo, previsto no artigo 40 da CF, e apartado do RGPS. Através desse artigo, a Constituição Federal concedeu autonomia para que os agentes da federação pudessem aplicar, caso quisessem, regras próprias para previdência dos seus servidores, aplicando-as através das respectivas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas. Enquanto isso, o próprio artigo 40 da CF dispõe de algumas regras específicas aos servidores da União. Estes conjuntos de regras exclusivas aos servidores são chamados de Regime Próprio de Previdência Social. Cabe destacar que após a Emenda Constitucional 103/2019, está vedada a instituição de novos planos de RPPS (parágrafo 22, artigo 40).
A reforma previdenciária ocorrida pela Emenda Constitucional 103/2019, amplamente debatida na sociedade brasileira, de forma até acalorada, trouxe algumas modificações importantes ao RPPS e ao RGPS. Para fins do nosso diagnóstico, a principal mudança deu-se na regra de aquisição:
a) no RPPS, estabelecimento de idade mínima de aposentadoria, de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres (o critério anterior era o tempo de contribuição: 35 anos para homens e 30 anos para mulheres);
b) para os servidores da União, também o estabelecimento de idade mínima de aposentadoria, de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres (o critério anterior previa 60 anos para homens, desde que tivesse tempo de contribuição de 35 anos, e 55 anos para mulheres, desde que tivesse tempo de contribuição de 30 anos);
Longe de ser uma reforma definitiva para o setor público, a EC 103 é quase que o pontapé inicial para que os entes da Federação disparem uma onda de revisões de seus planos previdenciários. No âmbito municipal, tivemos ao longo de 2020 e 2021 muitos municípios reformando os seus sistemas, não só os ajustando com as regras da EC 103, como aproveitando a ocasião para melhorar os enquadramentos atuariais e diminuir os potenciais déficits. Foi assim em algumas grandes cidades, como Porto Alegre, Recife, Salvador, Vitória, São José dos Campos, Joinville e São Paulo, entre outras, que se debruçaram no novo arranjo. Importante destacar que o Governo Federal disponibilizou uma espécie de manual detalhado de auxílio para que os entes da Federação pudessem promover as alterações necessárias para a adequação das Constituições Estaduais e Leis Orgânicas à nova regulamentação da EC 103, através da divulgação de Nota Técnica SEI n° 12212/2019 do Ministério da Economia². Sem dúvida, um material de grande valia e amplamente recomendável para que os entes da Federação possam balizar as alterações necessárias.
DIAGNÓSTICO
Paralelamente, em Curitiba, tivemos um agravamento do déficit previdenciário ao longo dos últimos anos. Em exposição à Câmara de Vereadores, o IPMC (Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Curitiba), que é uma autarquia e a entidade exclusiva que administra o RPPS do funcionalismo público da cidade, trouxe um quadro, no mínimo, desalentador.
O quadro atual aponta para um déficit alto, conforme abaixo demonstrado, em grandes números, conforme apresentação do presidente do IPMC em audiência pública em 17/9/2021³:
Orçamento do IPMC (2021)
Pagamentos aos segurados ........................... 1,589 bilhões
Receitas
Contribuição patronal (município) ......................... 390MM
Recebimento de servidores ativos .......................... 210MM
Contribuição dos segurados ........................................ 52MM
Rendimentos do fundo .................................................. 97MM
Outras receitas ................................................................... 91MM
Resultado / Aporte Previsto ....................................... 749MM
Ou seja, para que o se cumpra o orçamento de pagamentos, o município teria que aportar cerca de R$ 750MM, além da contribuição patronal de R$ 390MM prevista, totalizando R$ 1,14 bihões de recursos destinados em 2021.
É importante destacar que o orçamento de receitas e despesas do município de Curitiba é de aproximadamente R$ 10 bilhões para o ano de 2021. As despesas previdenciárias do município, somadas as contribuições patronais, aportes e demais custos estão orçados em R$ 2,3 bilhões, ou cerca de 24% do orçamento do município, transformando-se na alínea mais relevante de custos.
Na mesma audiência pública, o IPMC traz a informação do déficit atuarial futuro, levando em consideração projeções baseadas em modelos validados por empresa terceira contratada (Actuarial) para realização do cálculo. Esse déficit, em valor presente, seria da ordem de R$ 14,5 bilhões até 2055. Ou seja, seria necessário que o município aportasse R$ 14,5 bilhões, em valor atual, além da sua contribuição patronal, para que o déficit atuarial fosse zerado.
É importante destacar que o orçamento de receitas e despesas do município de Curitiba é de aproximadamente R$ 10 bilhões para o ano de 2021. As despesas previdenciárias do município, somadas as contribuições patronais, aportes e demais custos estão orçados em R$ 2,3 bilhões, ou cerca de 24% do orçamento do município, transformando-se na alínea mais relevante de custos.
Na mesma audiência pública, o IPMC traz a informação do déficit atuarial futuro, levando em consideração projeções baseadas em modelos validados por empresa terceira contratada (Actuarial) para realização do cálculo. Esse déficit, em valor presente, seria da ordem de R$ 14,5 bilhões até 2055. Ou seja, seria necessário que o município aportasse R$ 14,5 bilhões, em valor atual, além da sua contribuição patronal, para que o déficit atuarial fosse zerado.
Não é uma situação exclusiva do município de Curitiba, e a há inúmeras causas que contribuíram com o déficit dos entes da Federação ao longo do tempo. Entre os principais ofensores, estão a maior longevidade da vida do segurado, regras de aquisição de outras épocas, não mais compatíveis com o melhor padrão de vida da sociedade (sempre lembramos de algum caso onde determinado fulano ou fulana se aposentou com menos de 55 anos de idade), falta de contribuição do segurado aposentado, regras de benefício que levavam em conta os últimos salários recebidos, ao invés do salário médio enquanto na ativa, etc. Ao longo dos últimos anos, não só a EC 103, mas outras legislações foram aprovadas, visando corrigir e reduzir o problema.
Dessa forma, a Prefeitura do Município de Curitiba, através do IPMC, e com base nas melhores práticas, propôs ajustes na legislação municipal para que uma boa parte do atual déficit atuarial de R$ 14,5 bilhões fosse solucionado.
A sugestão do IPMC foi trabalhar em 2 fases. A primeira e mais simples, versa sobre correção de Lei Orgânica do Município, visando a equiparação das regras de aquisição do município à EC 103. Dessa forma, a Prefeitura encaminhou a proposição 0001.00002.2021(4) e a Câmara de Vereadores aprovou alterações da dos artigos 91 e 94 da Lei Orgânica do Município de Curitiba acerca da idade mínima para aposentadoria voluntária em 62 anos para mulheres e 65 anos para homens.
Entretanto, as regras só iniciam após a aprovação de Lei Complementar a ser apresentada.
No último trimestre de 2021, a Prefeitura encaminhou um projeto de Lei Complementar (proposição 002.00019.2021) (5) ainda a ser avaliada pela Câmara de Vereadores. Nesse projeto, detalha-se melhor alguns pontos, de forma resumida, entre eles:
I - Regras de aquisição
- valida as regras de aquisição, conforme EC 103 e Lei Orgânica aprovada, qual seja: 62 anos para mulheres, 65 para homens, além de 25 anos de contribuição e 10 anos de efetivo serviço público;
- concede benefício de idade aos professores (57 anos se mulher e 60 anos se homem);
- benefício especial para segurados de atividades com efetivas exposição a agentes químicos, físicos e biológicos (60 anos para homens e mulheres) e para segurador portador de deficiência (60 anos para homens e 55 para mulheres), considerando tempo de contribuição de acordo com a gravidade da deficiência (leve, média ou grave);
- regra de transição para segurado que tenha ingressado no serviço público até a data de entrada em vigor da Lei Complementar;
II – Cálculo da Composição e do Reajuste dos Proventos
- a aposentadoria será calculada a partir da média aritmética simples dos salários, desde julho 1994 ou desde a entrada do servidor (se posterior). O valor segue regras específicas, podendo variar de 60% a 100% dessa média;
- benefício limitado entre o salário mínimo e o teto do RGPS
III – Regras de Pensão
- estabelecimento de regras de aquisição por morte de segurado, e com benefício conforme EC 103 (50% do valor do aposentadoria, acrescido de 10% por beneficiário, limitado a 100% do valor;
IV – Custeio do RPPS
- aporte patronal de 26% em 2021, 27% em 2022 e 28% para 2023 em diante;
- contribuição de servidores ativos, aposentados e pensionistas em 14%, com limite máximo conforme estabelecido para o RGPS. Enquanto houver déficit, a alíquota incindirá sobre o valor que excede o salário mínimo;
SUGESTÃO
É certo que, as alterações propostas no âmbito da Lei Complementar apresentada pela Prefeitura de Curitiba, trará benefícios para a composição do atual déficit atuarial de R$ 14,5 bilhões, além de se adequarem às melhores práticas autorizadas pela EC 103 e constantes na Nota Técnica SEI n° 12212/2019. Entretanto, temos a intenção de contribuir com a proposta, sugerindo a abertura de uma discussão adicional à atual proposta de Lei Complementar.
A sugestão é a aplicação de alíquotas diferenciadas e progressivas aos atuais beneficiários (aposentados) do IPMC, além da contribuição atual de 14%. Poderia-se pensar em alíquotas que pudessem chegar a até 22% para beneficiários que hoje recebem a partir de 10 ou 15 salários mínimos. Seria uma contribuição progressiva e adicional por um tempo definido, até que se encerre o déficit atuarial do município.
Mais que tudo, trata-se também de correção de injustiças. Infelizmente, muitos servidores foram aposentados fora das melhores regras, com pouco tempo de contribuição e muitos com o valor dos seus últimos salários na integralidade. Não é de se espantar de termos servidores que se aposentaram com menos de 60 anos e com benefícios da ordem de R$ 20 mil, R$ 30 mil ou mais, e com expectativa de vida longa, até mesmo em decorrência do acesso a saúde e modo de vida saudável que as altas remunerações lhe proporcionam. Nesse sentido, enxergamos que essa seria uma correção saudável e que cabe ser discutida pela sociedade no âmbito da Câmara de Vereadores. Naquilo que possamos contribuir, já discutimos tal sugestão com o gabinete da Vereadora Indiara Barbosa, onde encontramos excelente recepção.
CONCLUSÃO
Como dito anteriormente, a EC 103/19 foi só o começo, para que os diversos entes da Federação possam promover alterações nos seus respectivos RPPS. Para o Município de Curitiba, tal discussão é urgente, como vimos, devido ao alto déficit atuarial e, especialmente, pela destinação de aproximadamente 25% do orçamento do município para pagamentos previdenciários, em conta que só tende a aumentar. A reforma através de Lei Complementar é imperativa para que o município busque uma equalização do déficit. Nossa contribuição, versando sobre a implementação de alíquotas de recolhimento progressiva para servidores aposentados, visa trazer mais justiça ao sistema e aliviar ainda mais as contas públicas municipais, para que os recursos sejam direcionados à saúde, creches e segurança pública.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha esposa, Fernanda Glosser, pelo apoio ao desenvolvimento do trabalho. Agradeço também à Vereadora Indiara Barbosa pelo incentivo às discussões, bem como à equipe de seu gabinete, em especial à Maria Natalha.
Também estendo os meus agradecimentos à Carlos Vagetti, pelas discussões o qual participamos a respeito do tema, e pelas “aulas” que o seu grande conhecimento sobre o tema me proporcionou.
Por fim, mais um agradecimento ao professor Ubiratan Guimarães, pelo carinho e preparo do curso de formação de líderes do Partido Novo, sem dúvida um marco na educação de futuros membros de diretórios e postulantes a cargos eletivos.